De vez em quando, umas verdades...

O professor de Direito Eleitoral fez um desabafo ontem na sala. Falávamos de perda de mandato, ações e processos eleitorais, essas coisas... O assunto foi aprofundando, a conversa foi ficando boa, até que ele desembuchou!

Não quero abrir um travessão aqui, porque não sei exatamente como ele falou. Mas disse que tem coisas que só acontecem no Brasil... Disse que não entendia como um desembargador levou um mês para se declarar suspeito no processo que queria (ou quer) a cassação do prefeito de Campina Grande. Quero esclarecer (para quem não sabe) que qualquer juiz pode se declarar suspeito e se afastar do processo (tá na lei). O que ele não entendia era demorar tanto tempo para fazer isso, numa coisa tão importante. E todo mundo esperando...

Outra coisa que ele disse foi a Paraíba ter que esperar vários meses o Ministro do Supremo Tribunal Federal voltar de uma licença médica, para que se viabilizasse a posse de Cássio como senador. É lógico que um ministro pode adoecer, e se isso ocorrer, deve se afastar. O que o deixava com a cara vermelha de indignação é o excelentíssimo não poder ser substituído temporariamente por outro... Por quê não chama outro? Por quê isso é proibido? E se dois ou três pegarem dengue? Vai ficar tudo parado? Sim, vai!

Ele disse mais. Que a teoria que ele ensina (muito bem, por sinal) não tem nada a ver com a prática corrompida da política e do direito lá fora... Que ele não vê a hora de se aposentar para procurar outra coisa pra fazer! Terminado o desabafo, pediu desculpas e encerrou a aula.

Como eu gosto dos reveladores desabafos! De vez em quando, umas verdades... É, sem dúvida, o melhor da aula.

Tenho dito (na verdade, pensado) que aquela aula puramente teórica, desligada da realidade, dos desafios e incoerências, próprios do mundo, é mais uma alienação do que qualquer outra coisa. Se não é para colaborar com a vida em sociedade, pra que serve essa formação? Pra receber o diploma, passar num concurso e ganhar dinheiro? Isso é ótimo (eu quero!), mas, sinceramente..., poderia ser muito mais.

Não quero ser radical nem parecer moralista. Estou sereno, apenas reflexivo. É que tenho visto professores desencantados com o ensino e alunos fugindo da jaula, quero dizer, da aula. E não tiro suas razões. Realmente, eles têm mais o que fazer...

O conhecimento mesmo, transforma, nos engrandece, nos tornando humildes. A mera informação (daquele artigo da lei) nem incomoda, nos ilude, com delírios de grandeza. Serve muito bem para abastecer um indispensável (e pomposo) sistema, que se retroalimenta (com fartura) e não está nem aí pra fome do mundo.

3 comentários:

  1. Dá um desespero parar para pensar no mundo real que nos cerca... Difícil mesmo é você conseguir ser forte o suficiente para, todos os dias, levantar-se da cama, se arrumar e sair para fazer algo que você não consegue encontrar mais sentido, que não traz perspectiva de efetivação, de excelência e muito menos de realização... É difícil, e o que nos resta é reinventar, recriar, todos os dias, um novo sentido, resignificar. O que nem sempre é possível! A outra opção é torcer para "se aposentar", e assim o pesadelo da decepção amenizar e tentar continuar a vida cantando, dançando, pintando ou fazendo poesia! O que seria um sonho!

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  2. Pois é Léo, a coisa não mudou muito. No ano de 1977, concluí o curso de Direito - a bem da verdade "Ciências Jurídicas e Sociais", naquela ocasião, num discurso, um de nossos Mestres já afirmava que: " entre a teoria, multiplicada nos bancos da Academia, e a realidade dos nossos Tribunais,havia um fosso de milhares de Kilometros". O Curso em si já havia sinalizado algo neste sentido, a prática forense, ainda que a conta gotas, já nos mostrava algo indigesto, que se revelava num desagradável engodo, pois começavámos a nos conscientizar de que alguns Professores faziam de contas que ensinavam, Alunos fingiam que entendiam, Juízes simulavam conhecer os litígios e, nos Tribunais, víamos conversas paralelas entre Desembargadores enquanto o Relator apresentava a matéria a ser votada, conforme sua ótica. Só nos restava a idéia que domina todo jovem: comigo vai ser diferente, meus clientes terão um advogado interessado, cobrarei dos Cartórios, dos Juízes e do Tribunal. Após quase 34 anos, não há decepção com a profissão escolhida, mas coleciono protesto presos na garganta, desaforos arduamente contidos na ponta da lígua e uma vontade incômoda de, em alguns momentos, pedir, educadamente, as suas "insolências" que em nome de juramentos feitos um dia se deem ao trabalho de, pelo menos, prestarem a atenção necessária a vida que está sendo devassada naquela sala na frente de pessoas estranhas e que, na maioria das vezes, não passam a mínima segurança aos que necessitam buscar a barra dos tribunais. Bom, faça de conta que ainda não viu ou ouviu nada do que estou dizendo, faça a diferença. Lourdinha

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  3. D. Lourdes, muito me emociona ouvir conselhos e expreriências como a sua. Estou iniciando meu caminho profissional e espero, sinceramente, contribuir positivamente, mesmo que timidamente, com a prática jurídica dos Fóruns, dos Tribunais, dos escritórios de advocacia e dos cursos de direito por aí a fora... Sei que contarei com o seu indispensável apoio, de conhecimento e maturidade. Muito Obrigado.

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