Para não dizer que não falei com flores...

Recebemos uma plantinha, que fora distribuída a algumas pessoas da família. Era pequena, num vaso ainda menor, para decoração de mesa, talvez. Minha esposa comprometeu-se a regá-la, só que ao fazê-lo, conversava com o vegetal, oferecendo-lhe palavras carinhosas...

Muito esquisito. Fui ensinado a falar somente para quem tem ouvidos. Mentira!, porque nem com os animais estabeleci este tipo de interação. Me restringi a gente mesmo, e nem todas... "Dizem que ajuda", justificava ela, convidando-me para aquela cena bizarra... Balbuciei uma ou no máximo duas palavras quaisquer, por insistência, e me retraí, porque aquilo era ridículo.

A plantinha nos chegou murcha, meio morta (se é que isso existe). Mas começou a revigorar. A reagir e botar flores, que sinceramente não cabiam para tão poucos galhos... Alegrou a mesa, a sala, a casa. Alegrou as paredes e as pessoas... Alegrou o espírito. Creditou-se o sucesso ao diálogo, já que os outros regaram, mas só a nossa vingara àquela altura.

Pensei como a gente é seletivo e comedido para o afeto... A gente dá amor, como quem dá dinheiro: fazendo cálculos. Como se isso fosse diminuir a economia da nossa alma, para favorecer a de terceiros (como uma transferência bancária entre corações da mesma espécie)... A gente ama como investimento: para receber depois, uma herança, uma pensão, nem que seja uma caixa de remédio das mãos dos filhos crescidos...

Parece que amar não segue a lógica da matemática - ou talvez lógica nenhuma. Porque dar, neste caso, não revela subtração, mas multiplicação, como a das flores, como a do pão... É ver para crer!

As preocupações do dia-a-dia nos fizeram esquecer da plantinha, que murchou de novo - murchou que faz pena. Só que, desta vez, sou eu quem vai cuidar dela. Vou conversar, mas em segredo, porque preciso conservar a minha reputação racionalista.

Um comentário:

  1. Conversar com as plantas faz tanto bem a elas quanto a gente. Principalmente se não tivermos meios para pagamento de psicólogo ou pacientes familiaes que nos escutem sem críticas, sem censuras, pelo simples fato de nos emprestar os uovidos e, algumas vezes, efetivamente nos dar atenção e até, sugestões. A bem da verdade conversar é algo maravilhoso. Pode desnudar nossa alma, mas, também pode construir excelentes relacionamento. Sua plantinha já mostrou que gosta de ouvir. Não tenha medo. Ridículo é querer fazer algo e se encolher com medo de ser visto como sentimentalista. O mundo está precisando disso. Seu texto está ótimo, leve e interessante. Como sempre.
    LOURDINHA

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